terça-feira, 26 de janeiro de 2010

Será que me enganei no calendário?




«Será que me enganei no calendário?».
Esta pergunta poderia estar a ser feita pela borboleta que hoje vi, quando fugia do caminho inundado de sol, à hora de almoço.

A brisa fria não foi generosa ao saudar a eclosão deste animal do Norte, sem passar do Centro, de asas recortadas, poligonais, castanhas que, quando fecha, deixa ver um C branco, numa posição tão estranha que parece ter escorregado numa casca de banana.

É a minha primeira Polygonia do ano! Não fiz foto, ia atrapalhá-la. Castanho-veludo carregado, como é típico da 1.ª geração do ano, desliza no ar em jeito de Ninfalídeo, voo seguro, batida auto-confiante, como se houvesse trilhos bem desenhados no ar que os meus olhos não vislumbram.

A semana passada, a meio, vi um macho de borboleta-limão, Gonepterix rhamni, pela mesma hora, em voo. Esta hiberna como insecto adulto, não será como a Polygonia.

Feito o registo, eu, por cá, fico com aquele bater de asa enregelado, que não perturbei mais, desta lagarta, filha do sol transformada em borboleta, que ao voar parece agitar as constelações escondidas, de cócoras, por trás do azul do céu.

terça-feira, 19 de janeiro de 2010

Antes que a luz pare mais acima

Narcissus triandrus


Elas vêm aí e trazem consigo o voo dos polinizadores, antes que as árvores parem o sol nas suas folhas. Primeiro as flores.

Quando começam a aparecer, elas não escondem a memória dos bosques nativos, abundantes de bens e recursos para toda a vida.
Quem ali vivia por mais que caminhasse, nunca os esgotaria. Cada trilho levava a mais bosques e ribeiros. Por isso, a questão de eles poderem um dia acabar nem se colocava. Hoje é o que se vê.

Como as árvores e arbustos de folha caduca do carvalhal começam a reter a luz lá em cima por volta de Abril, esse curto período de Fevereiro e Março - e no Outono com a queda da folha - uma série de pequenas plantas sabia que tinha de florir antes que a luz do sol se fosse. Só as da orla da floresta não precisavam dessa preocupação: o sol aparece ali todo o ano.

As prímulas adiantar-se-ão, assim como as violetas-bravas. De corola amarelada as primeiras e as outras com a cor que levam no nome, partilham o ritmo com outras espécies típicas.

Aparecem depois ranúnculos e, onde os houver, narcisos. O da foto foi em Seia, em Abril de há alguns anos.

As corolas são anúncios dirigidos a quem recebe o salário em forma de pólen e se compromete a levar informação genética a endereço adequado.

A Natureza tem muito bom gosto!

terça-feira, 5 de janeiro de 2010

Meixão: uma vida transparente

Pelo que vi nas notícias, é por esta altura que esse bicho transparente começa a aparecer à molhada junto às praias.

É proibido pescá-los. Mas como a iguaria em Espanha se vende em negócio chorudo... bem, está-se a ver.

Mesmo que a crise não andasse aí a castigar, a transgressão ia rolar na mesma.

Faz sentido a interdição: se estes juvenis de enguia forem dizimados, a capacidade reprodutiva da espécie tremelica.

No puzzle da vida, com maior ou menor intensidade, a ausência de mais esta peça retiraria de certeza recursos à sobrevivência da humanidade.

Depois, este animal tem um ciclo de vida espectacular. Nascem no mar dos Sargaços, não longe da Florida, em pleno oceano Atlântico.

Vai daí, vão crescendo e chegam às praias, procuram os estuários. São transparentes até aqui. À medida que sobem os rios, dando à barbatana agora em água doce (sem açúcar!), vão escurecendo.

A mudança de cor terá a ver com o lodo escuro que atapeta a fase final dos rios e ribeiros? Provavelmente. Mimetismo em acção.

Vão crescendo e vão subindo os rios. Instalam-se, quiçá num açude, discretas as enguias. Crescem durante meia dúzia de anos, até que sentem um clic.

Aí, descem os rios e procuram de novo o mar dos Sargaços, onde, numa orgia santa, se reproduzem e morrem, deixando as fêmeas uma postura para outra geração...

Hoje encontrei uma reportagem a respeito disto no site da RTP...